Krzysztof Pomian
Em "colecção", Pomian discorre
sobre o abrangente universo dos objetos existentes em museus ou coleções
particulares e questiona como categorizá-los.
Diz o historiador que "se se tentasse
fazer o inventário do conteúdo de todos os museus e de todas as colecções
particulares, mencionando apenas uma vez cada categoria de objectos que aí se
encontram, um livro grosso não seria suficiente" (POMIAN, 1984, p.51). Ele
aponta, ainda, que mesmo que esses objetos um dia tenham tido determinada
funcionalidade, "as peças de museus e colecções já não o têm" (1984,
p. 51). As funções originais já não existem. O valor de tais objetos é outro.
Ressalta também, que "todavia, não se pode dizer que as peças de colecção
ou de um museu estejam lá para decoração" (1984, p. 51). Mesmo 'sem utilidade',
as peças em museus ou coleções são cercadas de cuidados.
O autor assinala que há um mercado
oficial, mas também um clandestino, que é alimentado pelo furto. Frente a essa
evidência, diz Pomian, que "os colecionadores e os conservadores dos
museus comportam-se como guardas dos tesouros" (1984, p. 52).
Ao discorrer sobre a formação das
coleções, sejam elas particulares ou em museus, Pomian busca traços em comum.
Diz o autor, que uma definição descritiva do que é uma coleção pode ser
compreendida em "serem mantidos temporária ou definitivamente fora do circuito
das atividades econômicas; estarem protegidas em lugar preparado para esse fim
e estarem expostas ao olhar público" (1984,p.53). No entanto, ele destaca
o paradoxo dessa definição. Se não há valor de uso e, sim, valor de troca, como
se origina o valor de troca?
Para responder a essa questão, o autor
discorre sobre um instinto de propriedade ou uma propensão para acumular, que
" seriam próprias senão de todos os homens, pelo menos de todos os homens
civilizados ou, ainda, de certos indivíduos" (1984, p. 54). Se os objetos
que entram na coleção ou no museu perdem o valor de uso, a coleção desses
objetos serve a alguns usos específicos tais como: serem fontes de prazer
estético e proporcionar a aquisição de conhecimentos históricos ou científicos.
Pomian diz que essas não são
respostas suficientes. Para ele, se faz necessário ir além e procurar
compreender as coleções para além das fronteiras de nossa sociedade. Assim, ele
discorre sobre o mobiliário funerário, oferendas, presentes e os despojos, as relíquias
e os objetos sagrados, os tesouros principescos, as coleções: o visível e o
invisível e as coleções particulares e os museus.
No caso das coleções do mobiliário
funerário, "sua função é a de ser perpetuamente olhado e admirado"
(1984,p.56). As oferendas, as relíquias e os objetos sagrados estão vinculados
à comunicação entre os mundos visível e invisível.
(...) exactamente por causa da
função que lhes é atribuída – função que consiste em assegurar a comunicação
entre os dois mundos nos quais se cinde o universo –, os objectos são mantidos
fora do circuito das actividades económicas. Mas ver-se-á também que,
exactamente por causa da sua função, são considerados objetos preciosos, e que
portanto sempre se tentou reintroduzi-los neste circuito para trocá-los por
valores de uso, por coisas; por este motivo devem ser submetidos a uma
protecção especial. Constata-se então que os objectos não podem assegurar a
comunicação entre os dois mundos sem serem expostos ao olhar dos seus
respectivos habitantes. Só se esta condição for satisfeita é que se tornam
intermediários entre aqueles que olham e o mundo que representam (POMIAN, 1984,
p. 66).
Pomian discorre sobre diversos exemplos de
coleções e suas relações com o visível e o invisível e afirma que a coleção é
instituição universalmente difundida.
Semióforos
A partir do Paleolítico superior, diz
Pomian, o invísivel encontra-se projetado no visível, através das curiosidades
naturais e nas produções de ídolos, pinturas e adornos. Conforme registra o
autor, surge então uma divisão no interior do visível, a segregação entre a
coisa e o semióforo.
De um lado estão os objetos úteis (as
coisas) que ajudam a transformar a natureza a serviço do ser humano dando-lhe
subsistência e conforto. De outro, estão os semióforos, objetos que não têm
utilidade, mas que representam o invisível e são dotados de significado.
Pomian apresenta
as seguintes relações possíveis entre utilidade e significado: a primeira, onde
uma coisa tem apenas utilidade sem ter significado algum; a segunda, onde um
semióforo tem apenas o significado de que é vetor sem ter a mínima utilidade e,
por fim, os objetos que parecem ser, ao mesmo tempo, coisas e semióforos. Para
o autor,
“o semióforo desvela o seu significado
quando se expõe ao olhar, Pomian tira duas conclusões: a primeira é que um
semióforo acede à plenitude do seu ser semióforo quando se torna uma peça de
celebração; a segunda é que a utilidade e o significado são reciprocamente
excludentes: quanto mais carga de significado tem um objeto, menos utilidade
tem, e vice-versa”. (1984, p. 72)
Mas como se dá a atribuição de valor aos
objetos?
Pomian afirma que para possuir valor o
objeto deve responder a duas condições básicas e, na maioria das vezes
excludentes entre si: ou o objeto é útil ou é carregado de significado. Se não
forem úteis e nem possuírem significado se enquadrariam em uma terceira
categoria: o desperdício. “Os objectos que não reúnem nem a primeira nem a
segunda destas condições são privados de valor; de facto, já não são objetos,
são desperdícios (1984, p. 72).
O autor fala, também, em homens semióforos
e homens-coisas. Os semióforos são os representantes do invisível,
“dos deuses ou de um deus, dos antepassados, da sociedade vista como um
todo, etc” (1984, p.73). Os “homens-coisas” têm apenas uma relação indireta ou
nenhuma relação com o invisível.
POMIAN, Krzysztof. Colecção. In: Enciclopédia Einaudi.
V. 1 (Memória-História).Lisboa: Imprensa Nacional/Casa da Moeda, 1984. p. 51-8
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