De 3 a 7 de outubro de 2016 aconteceu, em Porto Alegre, o
I Seminário Nacional de História e Patrimônio Cultural, realizado pelo GT
História e Patrimônio Cultural, vinculado à Associação Nacional de História - ANPHU,
nas dependências da Faculdade de Biblioteconomia e Comunicação da UFRGS. Uma programação intensa incluindo
mesas-redondas, denominadas Diálogos Patrimoniais, Simpósios e apresentações de
trabalhos acadêmicos.
Conceituados profissionais oportunizaram à audiência reflexões
profundas acerca dos conceitos e práticas do fazer da história e do patrimônio
cultural.
No primeiro dia dos Diálogos Patrimoniais, com o tema O
Patrimônio e o ensino básico e superior, palestraram as professoras Márcia
Chuva, da Unirio e Carmem Gil, da UFRGS.
A Dra. Márcia Chuva iniciou sua fala chamando a atenção
para um conceito vulgar que paira nos discursos, “de que o Patrimônio Cultural
é visto pelos de fora como a cereja do bolo”. Ela propõe a compreensão de que
toda política de patrimônio interfere no direito de propriedade; que a política
de patrimônio está voltada a grupos excluídos e que os usos do patrimônio são estratégias
para legitimação do poder. “No Brasil, a
preocupação com a conservação de objetos materiais associada à construção de
uma história nacional e de um patrimônio correspondente deu-se de forma
sistemática e com base legal a partir da criação do então Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional”.
Para a palestrante, ao falar sobre o
entendimento do patrimônio na educação se faz necessário observar como o tema é
tratado na legislação, desde a Constituição de 37 até a Constituição Cidadã, de
88, que está em vigor.
Na de 37, aparece a garantia de propriedade; nas de 46 e
69, o amparo a cultura é dever do estado e na de 88, as competências são
ampliadas. Ela citou o que dispõe o artigo 216, da Constituição Federal (88)
sobre o Sistema Nacional de Cultura e destacou os incisos que versam sobre transversalidade das políticas
culturais e diversidade das expressões culturais.
Lembra, ainda, a Dra. Márcia Chuva, que nos anos 90, são
traçados os parâmetros curriculares e que, a partir de 2000, o Brasil é
signatário da Convenção da UNESCO sobre patrimônio cultural imaterial. Também
nesse período são articuladas políticas mais amplas com vistas à qualificação
dos atores envolvidos na temática da historia, ensino e patrimônio.
Chuva defende os aspectos do Currículo Nacional que determinam
temáticas transversais e interdisciplinares e critica a nova proposta de
governo sobre o ensino, pois aponta que ela restringirá a pluralidade.
Na sequencia, a palestra da professora Carmen abordou as
questões envolvendo a pesquisa e o ensino nas instituições de preservação do
patrimônio no Rio Grande do Sul. Gil
também faz duras críticas a proposta do novo currículo, que aponta práticas
culturais estanques. “É dever do ensino de historia historicizar problemáticas”.
Mas a critica não se restringiu a proposição governamental. Ela, através de
suas pesquisas e vivências identifica que há mecanismos e legislação para que
se desenvolvam boas estratégias pedagógicas para o processo de
ensino-aprendizagem no ambiente escolar. No entanto, a aplicabilidade é
deficitária. “Por vezes, as comunidades reconhecem mais as potencialidades do
patrimônio do que os próprios profissionais de ensino que atuam na área”.
Nos Diálogos Patrimoniais que trataram do Patrimônio Cultural e História: múltiplas
abordagens, os professores Cristina Meneguello, da Unicamp, e o professor
José Roberto Severino, da UFBA apresentaram suas reflexões sobre o tema.
A professora Cristina começou a sua fala apresentando
imagens das pichações ocorridas em São Paulo, em 30 de setembro, nos monumentos
aos bandeirantes e questionando os discursos rasos que surgiram, tanto na
imprensa, quanto nas redes sociais, de que esses seriam atos de vandalismo e o
fim dos monumentos. Para ela, monumentos em espaços públicos são espaços de
manifestação política.
Continuou sua fala tratando dos patrimônios difíceis,
cuja memória da dor deve ser mantida, posto que são signos das experiências
vividas. Citou autores que creditam ao patrimônio função de celebrar, rememorar,
transmutar e até esquecer. E continuou seus questionamentos acerca do
patrimônio e seus usos morais. Como lidar com a morbidez e o medo? E com
patrimônios dissonantes? E como escapar da espetacularização? Para a palestrante, é preciso levar as pessoas
a sentir mais, reconhecer os locais, o patrimônio. E termina sua fala dizendo
que receia, com a linha política em vigência, que “acabem com nossa proposta
patrimonialista”.
Já o professor Zé Roberto apresentou case sobre sua atuação
em comunidades escolares no Recôncavo Baiano. Ele desenvolve um projeto do uso
de audiovisual para trabalhar a temática do patrimônio com jovens da periferia.
Disse o professor que o audiovisual permite o ativismo, nestes tempos em que as
diferenças precisam ser acolhidas. Explanou sobre cultura e identidade na
escola a partir do conceito ampliado de cultura; das proposituras da Unesco e a
diversidade; Plano Nacional de Educação e Plano Nacional de Cultura.
Para finalizar o último dia dos Diálogos Patrimoniais, o
tema para reflexão foi: historiadores, museólogos, arquitetos, arquivistas: fronteiras
de práticas multidisciplinares e contou com as palestras dos professores Letícia
Julião, da UFMG e Paulo Knauss de Mendonça, da UFF e Diretor do MHN.
A Dra. Letícia Julião destacou que a proximidade da
história com os museus é recente, tendo seu início no século 20 e passou a
provocar reflexões sobre qual o lugar do historiador, qual sua contribuição na
administração do patrimônio; como a sociedade lida com o seu patrimônio
cultural; o museu como lugar de diferentes culturas; quais sentidos podem ser
vivenciados nos museus; linguagem das exposições e afirmou que a história nos
museus é fragmentada e que, ainda, há discursos tradicionais.
Já o Dr. Paulo Knauss tratou de um tema que lhe é caro:
Objeto enquanto agente histórico e discorreu sobre o trabalho que está
desenvolvendo nesse sentido, tendo como uma de suas referências, o conceito de
Neil MacGregor de que ”museus existem para contar a história por meio de
objetos”.
Ao acompanhar todos os Diálogos Patrimoniais – palestras e
intervenções do público – considero que foi um ganho para minha formação em Museologia.
As reflexões sobre o fundamental que o tratamento adequado do patrimônio posto
que sua relevância para a construção da consciência crítica da sociedade ficou
evidente, bem como o descaso dos entes públicos em viabilizar as condições
técnicas e econômicas que envolvem educação, museus e patrimônio.
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